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Planos de saúde coletivos podem sofrer reajuste de até 20% este ano; setor culpa aumento de custos

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Representantes do segmento dizem que o acréscimo ocorrerá pela disparada dos itens médico-hospitalares, incremento do uso de serviços e a incorporação de tecnologias.

Brasil terminou 2023 com 42,1 milhões de pessoas com planos de saúde coletivos.

Os planos de saúde coletivos enfrentarão reajustes em 2024, o que afetará 42,1 milhões de pessoas no país. Isso ocorrerá por conta da disparada dos custos médico-hospitalares, aumento do uso de serviços de saúde e a incorporação de tecnologias, dizem representantes do setor. Não há, porém, uma estimativa de quanto será o acréscimo, pois não existe uma norma que limite o aumento anual no caso dos planos coletivos. Ainda assim, a expectativa é de um incremento que afete o bolso do consumidor.

Um estudo da consultoria AON dá pistas do que pode ocorrer: o material indica que os preços dos insumos médicos no Brasil subiram 14,1% enquanto os custos gerais aumentaram 4,8%. A consultoria Arquitetos da Saúde, por sua vez, estima que os planos coletivos ficarão, em média, 20% mais caros em 2024.

Como funcionam os planos de saúde
Segundo Agência Nacional de Saúde (ANS), que regula o setor, 2023 terminou com 51 milhões de usuários de planos de saúde no país. Existem dois tipos: individuais e coletivos, com diferentes normas de reajustes.

O valor dos planos individuais (e/ou familiares) pode ser aumentado a partir de um percentual máximo definido pela ANS – em 2023 foi 9,6% – e por conta da mudança de faixa etária do usuário.

A situação muda para os planos coletivos, que não têm o percentual máximo estabelecido pela agência reguladora. É o que representa a maior parte do setor: 42,1 milhões, ou 82,5% do total. O grupo tem duas divisões. Os empresariais ou por adesão reúnem até 30 beneficiários e devem ter o mesmo percentual para todos os participantes.

O outro inclui os planos coletivos empresariais ou por adesão com mais de 30 beneficiários, que representam a grande parcela do setor (36 milhões ou 70,5%). O valor do reajuste é definido em negociação entre as operadoras e as pessoas jurídicas contratantes – empresas, associações, sindicatos ou entidades de classe –, e não pela ANS, como no caso dos planos individuais ou familiares.

Reajustes altos não são novidade
A tendência de aumento de preços nos planos de saúde é observada em uma pesquisa do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) divulgada no ano passado, que analisou dados do setor entre 2018 e 2022. Os planos individuais, regulados pela ANS, foram os que, em média, variaram menos no período, enquanto os empresariais com até 29 beneficiários – para micro e pequenas empresas – tiveram a maior diferença percentual:

Individuais: 35,4% de aumento entre 2018 e 2022
Coletivos empresariais, com mais de 30 pessoas: 58,9%
Coletivos por adesão, com 30 pessoas: 67,6%
Coletivos por adesão, com até 29 pessoas: 74,3%
Coletivos empresariais, com até 29 pessoas: 82,3%
Na prática, planos de saúde individuais saltaram, em média, de R$ 522,55 para R$ 707,59 (35,4% a mais) entre 2018 e 2022. Já os planos coletivos empresariais com até 29 pessoas subiram de R$ 539,83 para R$ 984,44 (acréscimo de 82,3%).

Para o Idec, a discrepância indica a necessidade de a ANS criar normas para os planos coletivos.

— No ano passado, tivemos reclamação de reajuste de 29% (em um ano). É algo que estamos acostumados e detectamos há muito tempo, porque os planos coletivos não têm um teto para aumento, então o reajuste varia muito de contrato para contrato — explica Marina Magalhães, pesquisadora do programa de saúde do Idec.

O instituto organizou uma campanha chamada Chega de Aumento no Plano de Saúde. Entre os pedidos estão a equiparação dos planos coletivos contratados por microempreendedores individuais (MEIs) a planos individuais, para que sejam contemplados com a limitação de reajustes.

Consideramos que é possível trabalhar com o pressuposto de negociação, mas defendemos que a operadora apresente a justificativa do cálculo do reajuste.
MARINA MAGALHÃES
Pesquisadora do programa de saúde do Idec.

Padronizar cláusulas de reajuste em todos os contratos coletivos e tornar obrigatória a apresentação completa do contrato coletivo para o consumidor são outros dois dos pedidos do Idec.

— Consideramos que é possível trabalhar com o pressuposto de negociação (entre operadoras e empresas), mas defendemos que a operadora apresente a justificativa do cálculo do reajuste. É comum, em contrato coletivo, a empresa negociar com a operadora e o funcionário não ter acesso ao contrato — comenta a pesquisadora.

Marina argumenta que a atuação mais efetiva da reguladora nos contratos coletivos poderia auxiliar o trabalhador a compreender melhor os motivos dos aumentos do setor.

— Na prática, quando o consumidor registra uma reclamação na ANS, a agência diz que não tem competência para resolver o problema por não regular os reajustes coletivos. Portanto, é importante uma regulação; sem isso, o consumidor fica sozinho: não adianta ele ficar esperneando para todos os órgãos, porque dificilmente vai ter alguma resposta positiva — acrescenta.

GZH questionou a ANS sobre o reajuste dos planos de saúde e a atuação da agência no setor, mas não recebeu retorno até a publicação desta reportagem.

O que explica o aumento de preços
Para Giácomo Balbinotto Neto, especialista em economia da saúde e professor da Faculdade de Economia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), a tendência de aumento nos planos de saúde está vinculada, em parte, à mudança do perfil da população. O envelhecimento do brasileiro e a melhora da expectativa de vida são exemplos citados pelo estudioso como decisivos para os custos do mercado.

— Há 20 ou 30 anos, a pessoa morria por conta de um problema cardíaco, de diabetes. Hoje, ela consegue conviver com isso, mas precisa ir com mais frequência a hospitais, fazer mais exames e ir ao médico mais vezes — resume.

Todos os anos são incorporados novos tipos de exames sofisticados, procedimentos robóticos e medicamentos caros: esses custos são incorporados ao preço dos planos
GIÁCOMO BALBINOTTO NETO
Professor de Economia da UFRGS

Além da busca mais frequente pelos serviços médicos, ele argumenta que o setor tem encarecido por causa da inclusão de tecnologias e processos judiciais de usuários.

— Todos os anos são incorporados novos tipos de exames sofisticados, procedimentos robóticos e medicamentos caros. As pessoas também judicializam o acesso a medicamentos e tratamentos: esses custos são incorporados ao preço dos planos — acrescenta.

Não há indicativo de que a situação mudará no futuro, pois é esperado que os custos da saúde continuem mais altos do que a inflação oficial do Brasil, projeta o professor. A situação pode piorar o sistema público:

— Há 42 milhões de pessoas nos planos de saúde coletivos; se 10% delas saírem, vamos ter consequência no custo para a saúde pública também. É bastante preocupante, pois o SUS já enfrenta dificuldades de filas e recursos — pontua o economista.

O que o setor diz sobre o aumento
Por meio de nota à reportagem, a Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge) disse que os reajustes são reflexos do aumento dos custos médico-hospitalares, cuja variação é superior aos índices de inflação devido “aos níveis crescentes de utilização dos serviços de saúde e a incorporação acelerada de tecnologias”.

Infelizmente, a inflação médica é superior ao índice oficial do IPCA. Isso tem pressionado fortemente os custos das operadoras.
MARCELO DIETRICH
Diretor da Doctor Clin.

A entidade informou que, entre 2021 e 2023, o setor registrou prejuízo operacional de R$ 20 bilhões, “evidenciando um desafio financeiro extremamente significativo – as mensalidades hoje não são suficientes para o pagamento das despesas assistenciais”.

Por fim, a Abrange informou que não há previsão de quanto em média os planos de saúde subirão neste ano e que aguarda a consolidação dos números do setor no ano passado para projeções.

Marcelo Dietrich, diretor da Doctor Clin, reforça que os reajustes são necessários para a continuidade dos serviços.

— Infelizmente, a inflação médica é superior ao índice oficial do IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo). Isso tem pressionado fortemente os custos das operadoras, obrigando o setor a repassar esse aumento aos clientes para manter a capacidade de pagamento dos tratamentos pelas operadoras — diz.

Dietrich pontua que a Doctor Clin ainda avalia qual será o percentual de aumento neste ano, mas estima que o valor deverá subir em torno de 10%; o acréscimo poderá ter variação conforme o porte da empresa e o índice de utilização.

O diretor acrescenta que, nos últimos cinco anos, a Doctor Clin foi a operadora com os menores índices de reajuste nos contratos de até 29 pessoas na comparação com concorrentes locais; essa categoria foi a que teve o aumento mais significado no país segundo o estudo do Idec citado nesta reportagem.

Conforme Dietrich, a revisão periódica do rol de coberturas obrigatórias dos planos de saúde também pesa nos custos da saúde:

— A inclusão de novos medicamentos quimioterápicos, as terapias para tratamento de transtornos do desenvolvimento como o transtorno do espectro autista e a cobertura para algumas doenças raras são alguns exemplos. São novas obrigações para as operadoras, que ampliam e melhoram a cobertura aos usuários que precisam, mas isso impacta nas mensalidades de todos os clientes — pontua.

Observamos o comportamento agravado dos custos pelo aumento de frequência, novas tecnologias e novas inclusões no rol de cobertura.
MÁRCIO PIZZATO
Presidente do Conselho de Administração da Unimed Porto Alegre

Márcio Pizzato, presidente do Conselho de Administração da Unimed Porto Alegre, diz não ter uma estimativa de reajuste dos planos em 2024 porque, segundo ele, “cada contrato tem suas particularidades conforme a sua utilização, sinistralidade do período e especificidades acordadas”. O aumento será consequência de diversos fatores:

— Observamos o comportamento agravado dos custos pelo aumento de frequência, novas tecnologias e inclusões no rol de cobertura e a sinistralidade (uso do plano) se manteve elevada em 2023, o que afetou o mercado como um todo — explica.

Outro ponto destacado por ele é quanto às fraudes: Pizzato cita um estudo feito pela Ernst & Young e o Instituto de Estudos de Saúde Suplementar (IESS), para explicar o problema:

— Estima-se que a cada R$ 100 faturados, R$ 12,70 são perdidos, de 12% a 18% das contas hospitalares apresentam itens indevidos e até 40% dos exames são desnecessários. É preciso mantermos olhar atento e esforços voltados para temáticas como custos, receita e despesas operacionais e manter a busca constante por uma maior eficiência da gestão para mantermos a sustentabilidade do negócio. Todos estes fatores impactam nas mensalidades.

GZH

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